domingo, 7 de junho de 2015

Vou e fui


Volto aqui. Ao lugar onde tudo começou. Está no mesmo sítio como no 1º dia em que o vi e no entanto está tudo diferente. O rio é o mesmo e em frente, os mesmos prédios e montanhas a rasgar os céus em verde mato. As pessoas continuam a caminhar e a cumprimentar quem encontram pelo caminho mas desta vez eu compreendo o que me dizem. O silêncio ignorante do passado, é agora ruído que não me deixa relaxar como antigamente e nas águas furiosas, vejo os meus sonhos a boiar.
Era tudo tão diferente. Tão novo. Tão mágico. Tão misterioso. E eu... eu era tão curiosa e aventureira. Tinha tantos planos como sonhos. Eu... era tão ingénua.
Volto aqui anos depois de tudo ter começado. Um capítulo novo. Uma página em branco escrita em 1000 cores entre bons e maus momentos. O sítio é o mesmo mas eu mudei. Sou mais real, fria, menos crente e na minha cabeça troquei os sonhos por um único, sair daqui. Para longe deste vale onde moro agora. Não ter mais de respirar este ar que não circula fresco. Simplesmente, sair. Abandonar uma vida confortável cheia de nada, que não me traz felicidade e arriscar às cegas numa procura por algo melhor.
Largo os maus momentos aqui e fecho o capítulo, na esperança que as memórias perdurem mas não o seu peso. Vou mais livre, mais leve, sem nada mas vou. Um pouco melhor do que quando aqui cheguei, um pouco menos do que aquilo que ainda quero ser.

Who are you?

A sociedade transformou-se numa nuvem de pó. Vejo as pessoas no meio da multidão mas nunca com a nitidez necessária para voltar a acreditar nela.
Quem é aquela pobre coitada que de bebé ao colo, pede dinheiro na rua com 33ºC? Quem são as mulheres que páram perto dela e de carteira Chanel, recolhem os trocos que ela fez?
Quem é aquele homem bonito que me olha com olhar de apaixonado e quem são aquelas 3 crianças todas parecidas com ele e com a mulher que foi ao WC?
Quem é a mulher que me dá uma rosa do jardim ali ao lado e a seguir me pede 1€ por ela? Corro atrás para lhe devolver a rosa e ela foge... guardo-a e é ela que corre atrás de mim e do dinheiro. Fica no chão. Como ficam todos os outros em quem já deixei de acreditar. O homem que simpaticamente me pergunta as horas e me faz cara feia quando percebe que sou estrangeira num mundo que afinal de contas, nunca pertenceu a ninguém. A mulher frustrada na caixa de supermercado, incapaz de simpatia. O homem que me vendeu, em inglês, o serviço de internet e se recusa a falá-lo quando preciso de ajuda. A todos os que aqui me discriminam no saco de emigrantes comuns, sem se lembrarem que também eu pago impostos.
Dizem que a culpa da frieza das pessoas, é da crise. É a maior mentira que nos contam. Aqui não há crise. Apenas a de valores. Aqui, em casa e na maior parte do mundo, já não há leis por onde as pessoas se regem sem que estas sejam para o bem pessoal.
E eu tento ser optimista. Abrir os olhos e tentar ver para além das aparências.... vejamos: temos o típico miúdo popular que aparenta estar nos seus 20's mas pede a um desconhecido mais velho que lhe compre cerveja provando que não tem mais de 16... está acompanhado por outro que ao telemóvel insulta a sua namorada por estar atrasada 5 min. Temos ainda a mulher que não contente com os gelados de dois sabores já misturados, insiste que o homem lhe ponha meia bola de um e meia do outro. Por trás dela, o homem de sapatilhas Nike que cata garrafas do lixo para recolher dinheiro de vasilhame no supermercado e logo a seguir, com a mesma mão que foi ao lixo, acaricia o cão de uma criança... e eu juro que tento... mas fica muito difícil.